quarta-feira, 27 de junho de 2012

Amor divino


"Dionísio foi arrebatado ao ouvir este lamento. Notou Kekropia¹, conhecia o nome de Teseu e da traiçoeira viagem à Creta. Diante de Ariadne apareceu em toda sua radiante divindade. Eros moveu-se rapidamente e, com flechas urticantes, arrebatou a donzela a um nobre amor, levando a filha de Minos a unir-se de bom grado ao seu irmão, Dionísio. Então o deus confortou Ariadne, amorosa e lamentosamente, com essas palavras em sua voz encantadora:


'Donzela, por que sofres pelo enganador de Atenas? Vamos esquecer a memória de Teseu. Tens Dionísio para seu amante; um marido incorruptível contra o marido de um dia! Se estás satisfeita com o corpo mortal do companheiro dos anos de juventude, Teseu nunca poderá desafiar Dionísio em vigor ou formosura. Mas tu dirás, [ele matou o Minotauro]... Não é por acaso a frota [de Teseu] veio parar na minha Naxos; Pothos² reservou a você um nobre noivo. Feliz és tu, deixa a pobre cama de Teseu para deitar-se sobre o sofá de Dionísio, o desejável! O que mais poderias tu pedir em preces? Tens o céu como casa e Chronos como padrinho... Para ti, eu farei uma constelação de estrelas, e serás chamada a brilhante companheira de cama do amoroso Dionísio'."


Nono, Dionisíaca 47.265

Tradução livre.

Revisão de Thiago Oliveira.

¹ - Antiga cidade grega;
² - Era um dos Erotes, sendo o responsável pelo desejo sexual.

domingo, 3 de junho de 2012

Magia negra* revelada em duas antigas maldições


        Em um tempo onde a magia negra era relativamente comum, duas maldições envolvendo cobras foram lançadas, uma visando um senador e a outra um médico de animais, diz um pesquisador espanhol que acaba de decifrar as maldições de 1.600 anos de idade.
  Ambas as maldições possuem a representação de uma divindade, possivelmente a deusa grega Hécate, com serpentes saindo de seu cabelo, provavelmtente destinadas a atacar a vítima. Ambas as maldições contem invocações gregas semelhantes às invocações a Hécate.
  As duas maldições, escritas principalmente em latim e em tabuletas de chumbo fino, teriam sido criadas por duas pessoas distintas no final da vida do Império Romano. As duas tabuletas foram descobertas em 2009 no Museu Arqueológico Cívico de Bolonha, na Itália, e foram originalmente adquiridas pelo museu durante o século XIX. Apesar de os estudiosos não saberem ao certo a origem das tabuletas, depois de analisar e decifrar as maldições, eles sabem quem eram suas vítimas.


Mate o porco


  Uma das maldições tem como alvo um senador romano chamado Fistus e parece ser o único exemplo conhecido de um senador amaldiçoado. A outra maldição se destina a um veterinário chamado Porcello. Ironicamente, Porcello é a palavra latina para porco.
Celia Sánchez Natalías, uma doutoranda da Universidade de Zaragoza, explicou que Porcello era provavelmente seu nome verdadeiro. "No mundo das tabuletas de maldição, uma das coisas que você deve fazer é tentar identificar a sua vítima de uma forma muito, muito exata."
Sánchez Natalías acrescentou que não se sabe quem amaldiçoou Porcello ou sua razão. Pode ter sido por razões pessoais ou profissionais. "Talvez essa pessoa era alguém que teve um cavalo ou algum outro animal morto pela medicina de Porcello", disse Sánchez Natalías.
"Destrua, esmague, mate, estrangule Porcello e sua mulher Maurilla. Suas almas, corações, nádegas, fígados..." parte do escrito. A iconografia da tabuleta na verdade mostra Porcello mumificado, seus braços cruzados (como a divindade) e seu nome escrito em ambos os braços. [Ver imagens da tabuleta]
O fato de tanto Porcello quanto a divindade terem os braços cruzados é importante. Sánchez Natalías acredita que o feitiço força a deidade e, portanto, Porcello a se tornarem vinculados. "Essa comparação pode ser entendida de dois modos: ou 'a deidade é forçada, por isso Porcello também será' ou 'até quando Porcello estiver forçado, a divindade também estará'", ela escreve em uma recente edição do jornal Zeitschrift für Papyrologie und Epigraphik.


Que todos os seus membros se dissolvam...

O caso de Fistus, um senador romano, também é notável. O senado na Roma antiga era um lugar de grande riqueza, e, mais cedo na história romana, foi um local de considerável poder. Até o momento a maldição foi escrita no final do Império Romano, onde a influência do senado foi diminuída em favor do imperador, do exército e da burocracia imperial.
Fistus teria sido uma pessoa que possui alguma riqueza, e quem escreveu a maldição talvez quisesse seu lugar. A expressão latina para "esmagar" é usada no mínimo quatro vezes na maldição. "Esmague, mate Fistus, o senador", diz a maldição, "Possa Fistus diluir, definhar, afundar e todos os seus membros se dissolver..."
Novamente Sánchez Natalías não tem certeza dos motivos da maldição; mas, qualquer que sejam, até mesmo pelo padrão de modernos anúncios de ataques políticos, este foi um golpe sórdido senatorial.
A tradução de Sánchez Natalías e o estudo da maldição do senador é detalhado em dois artigos recentes publicados pela revista alemã Zeitschrift für Papyrologie und Epigraphik.

*: resolvi manter o título original do artigo, sem entrar em méritos quanto à natureza da magia.